A música tem um poder
transformador. Estudos diversos em torno dos sons e da música demonstram o seu
poder terapêutico. São infinitas as possibilidades de transformação dos estados
de ânimo, as mudanças de comportamento no ser humano e também nos animais e até
nas plantas. A Musicoterapia é a disciplina por excelência capaz de observar essas
transformações através de estudos e experimentos. Aliada a ela, outras áreas do
conhecimento ajudam nas descobertas de novos caminhos de superação dos desafios
que a vida nos impõem. Nunca houve uma diversidade de sons ritmos e melodias diferentes
como na pós-modernidade. Vivemos num tempo de poluição de todos os tipos, incluindo
a poluição sonora.
Constata-se que em nossas igrejas
e comunidades católicas, graças a criatividade de seus músicos, multiplicam-se
as canções, os ritmos, os novos estilos e autores e cada dia aparece mais
jovens nelas mergulhados. No geral, são músicas de belas melodias, que impelem
a certa mudança de vida; músicas para adoração, para pedir perdão, para
aprender a perdoar, para superar um sentimento negativo, músicas que falam
sobre Deus... a temática é infindável. São músicas de cunho religioso que, em
grande parte tratam da relação “eu e Deus”.
Para onde a música católica está
nos levando? Em que nossa juventude está sendo moldada? Em que rumo está sendo
levada? As músicas católicas estão transformando os nossos jovens? Em que? Somente
analisando suas mensagens poderemos obter uma resposta mais aprofundada, o que
não é o objetivo deste texto. O conteúdo mais que a forma é o que desperta
dúvidas.
Não discuto aqui a música
litúrgica, o foco é questionar até que ponto estamos utilizando do poder da
música para transformar nossa juventude
e os que delas estão se utilizando. O conteúdo expresso deveria ser capaz de
transformar a “vida da pessoa toda” e não apenas a sua dimensão religiosa, afinal,
esta, não é mais importante que as demais dimensões. Porque será que temos em
nossas igrejas tanta gente se casando mas não sabe relacionar-se com o cônjuge?...
jovens que celebram o Sacramento do Crisma e logo some da Igreja?... Talvez seja a supervalorização da dimensão
religiosa, esquecendo-se das dimensões afetiva, social, etc. Podemos cantar o
amor de Deus por nós, a importância dos sacramentos, os milagres de Jesus...
mas se a melodia não iluminar o chão da vida e a pessoa não for capaz de lidar
com suas questões sexuais, afetivas, relacionais, econômicas, intelectuais... a
melodia da vida pode virar uma completa desorganização e desafinar o concerto
da existência.
A impressão é que a maioria das
músicas se propõem a afagar e fortalecer egos, o que a primeira vista pode ser
muito positivo. Porém, pode levar a uma posição de conforto ou a um sentimento
de saciedade, sem que leve a inovar e renovar o cotidiano. Assim, a música religiosa
pode não inspirar nem mostrar caminhos novos para que as pessoas dêm passos
significativos e transformadores, afinal elas ouviram apenas o que desejavam ouvir, faltando um contato fecundo com a poesia que as inspire na busca de outros rumos. A visão reduzida só as faz patinar no lugar
onde estão, afinal, quem pouco enxerga, pouco caminha.
Ademais, essa cultura frágil e
líquida em que vivemos, não colabora para que surjam novos poetas, com novos conteúdos
musicados, com poesia de qualidade. É difícil encontrar músicas com poemas
admiráveis, com sabedoria e mística, com o encanto das perguntas. Os cantores
e poetas mais admirados estão chegando ao entardecer da vida e estamos ficando
com a mesmice periférica da pós-modernidade, que muitas vezes canta
respostas de perguntas que não foram feitas. A música transformadora não é aquela que
responde dogmaticamente as perguntas de alguém, mas é aquela que provoca
a descoberta das questões até então não despertadas, impulsionando as descobertas de respostas e novas perguntas.
Música é também arte que alimenta
a alma, a existência. Com ela, podemos transformar a vida das pessoas e mostrar-lhe novos caminhos, rumos diferentes e assim, desperta-las para a busca de sua
realização. Cabe àqueles que têm em suas mãos o poder transformador da música,
zelar pelo enriquecimento de suas obras não oferecendo o “feijão com arroz” sem
que capriche com arte e sabedoria divinas o alimento melodioso da inspiração,
da admiração, que provoque e não apenas console; que motive a descoberta das
rotas do prazer da vida e não proponha sofrer; que leve a uma experiência de Deus
e não apenas O adore. Músicas que alimentem e façam sonhar, pois quem é
fecundado de sonhos possui força e motivação para transformar a vida e a
realidade em que vive.
Ir. José Torres, CSsR.